RADIVÔI STANIVUK
SÉRVIA
( 1960-)
POESIA SEMPRE. Minas Gerais. Número 29. Ano 15. Editor Geral: Marco Lucchesi. Rio de Janeiro: MINISTÉRIO DA CULTURA / Fundação BIBLIOTECA NACIONAL, 2008. 372 p. ISSN 0104-0626 No 10 847
Exemplar na biblioteca de Antonio Miranda´
Domingo, no metrô Domingo, no metrô,
quando você ouve somente o som do trem como vento, vagão semivazio na manhã vazia em meio à qual
palavras vazias são lidas por sombras nos jornais.
Você viaja com pessoas ou com sombras do mundo subterrâneo?
Todos se calam, conformados com o destino,
feito túneis no meio de suas próprias trevas,
e aquele que fala
fala na manhã vazia de domingo,
no silêncio crepitante anterior à Existência,
na treva de que o Filho do homem está rodeado.
Um monte de cartas jogadas esparrama-se pelas estações,
junto aos que dormem, aos bêbados, drogados, pessoas descartadas, na esquina da passagem subterrânea cheiro de flores que,
exceto o vendedor miserável, ninguém mais olha,
a nossa escuridão fundiu-se com a escuridão, e não enxergamos
além de nós mesmos,
mas vemos os ensandecidos, raivosos, infelizes,
verdadeiro sangue humano na estação do subterrâneo,
e passamos ao largo, não os percebemos conscientemente,
somos gente morta, sombras vivas,
o sofrimento e o cansaço e o suor e a dor são nossos alimentos, quando saímos à luz do dia, como se nada houvesse,
somos outros, gente viva, sombras mortas.
Domingo, no metrô,
silêncio fantasmagórico de ar parado,
em trinta anos, pela primeira vez,
na entrada do vagão, você economiza o cigarro ainda não-fumado, economiza o tempo e acostuma-se ao aperto,
à insolência e aos bárbaros, à insensibilidade
e ao embrutecimento,
uma vez você também será um cidadão, bién integé,
o que significa besta, filho de Moloque,
descendente emurchecido do carvalho na metrópole da Inquisição.
Domingo, no metrô,
manhã vazia quando as crianças berram
e o vento abre as portas automáticas do vagão,
é a saída - tempo, o tempo é a saída,
mas sair onde, se não há saída alguma,
somente uma escadaria larga, maquinai, que não conduz
a lugar algum.
Apenas grades de ferro, que se fecham diante de você.
Certo violino acompanhará você ao subterrâneo
como o som de um leproso, como o grito de um enjeitado,
como a mão de um pedinte,
em vez de Deus, pequenos ídolos esparramam-se pelas paredes
de onde as estrelas diárias sorriem com escárnio, atiradas fora domingo, domingo, quando somente a angústia efervesce,
apenas a fugitiva irmã da palma de sua mão que feito brinquedo
está dentro do bolso e você amarrota e aperta até tirar sangue.
*
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PÁGINA publicada em setembro de 2024
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